domingo, 10 de abril de 2011

NEGRO SPIRITUAL

           Paz em Cristo, amados. Aqui estão textos que consideramos ser essenciais ao conhecimento (e consciência) do que é afinal música do tipo Negro Spiritual, conhecimento básico que todos os líderes de quartetos deveriam dominar mas não o fazem, prejudicando uma visão global deste aspecto da música sacra e até mesmo a atenção às sutilezas do estilo. Estudar também é essencial!

Texto 01:
O QUE É NEGRO SPIRITUAL
(Extraído e adaptado do site Wikipédia: pt.wikipedia.org)
Spiritual (também chamado de Negro Spiritual) é um gênero musical cuja aparição se deu nos Estados Unidos da América. Foi inicialmente interpretada por escravos negros. Faziam uso de movimentos rítmicos do corpo e batiam palmas como acompanhamento da música.
Histórico
A música é chamada de spiritual por ser quase uma canção de inspiração do escravo negro. Embora às vezes o spiritual seja alegre e num andamento mais allegro com o chamado shout (em português, "grito"), para a dança entre eles, grande parte dos spirituals tem um tom manso, num andamento "largo" e meditativo e, os negros, acorrentados, poderiam cantar sentados e a capela. Mas, a idéia do espiritual vem de uma raiz bíblica, das canções espirituais que podemos encontrar na leitura desta, com a menção de "canções espirituais".
"falando entre vós com salmos, entoando e louvando de coração ao Senhorcom hinos e cânticos espirituais…"[1]
O Spiritual dos afroamericanos começou a surgir durante os anos da escravidão, que podem ir até bem antes da Revolução Americana, de 1776, mas foi só por volta de 1860 que a música começou a ser publicada. Neste ano (1860), vários estados já haviam emancipado a escravidão.
Forma
O Spiritual freqüentemente usa a forma Canção, seguindo o formato:
  • "A" para o primeiro verso
  • "A" para o segundo verso ( "A"= repetindo a mesma melodia)
  • "B" segue um refrão e, em geral, volta ao início (com o da capo) e repete o formato com versos diferentes.
Podemos citar como exemplo desta forma o Were You There When They Crucified My Lord" (em português, "Voce estava lá, quando eles crucificaram o Senhor?”). Esta forma não é uma regra para não ser quebrada; logo, encontramos espirituais também em Forma Estrófica e aparenta até um hino sacro, em seu estilo.
Estilo
Um estilo melódico, com texto em Inglês, seria uma canção num tom otimista, cantada com júbilo, ou com tom de meditação, como uma canção para reflexão espiritual ou de lamento pessoal; sempre com letra evangélica ou de meditação, podendo ser cantada solo, sem acompanhamento, uma vez que os negros não tinham quase nenhum instrumento musical, ou com um acompanhamento de gaita. Quando num culto na igreja, pode ter um canto responsivo, com um coro, cantando as repostas do solo durante o refrão, ou até ecoando o próprio canto solo, como responsório, durante a música toda. Em muitas interpretações o cantor entoa os versos meigamente, e quando inicia o refrão entoa uma postura e dicção mais arrastada e agressiva, com mais altura no timbre e num ataque com mais velocidade. A melodia é bem diatônica e não tende a modular, ou apenas modula a um tom acima, para colorir um verso final com mais ânimo, por exemplo, mas modulações não aparecem, em geral, nas partituras originais – são apenas detalhes de arranjos mais modernos. Deste estilo surgiu a música gospel. O estilo foi se estabelecendo comercialmente no Século XX e compositores brancos começaram a escrever espirituais também. Os cenários do período da conquista do Oeste de onde os escravos viveram, serviu de inspiração para diversos musicais da Broadway, tais como "Oklahoma" de (Rodgers e Rammerstein), (1943); "Showboat" de (Jerome Kern e Hammerstein) (1927); nos quais os enredos se davam nos estados da nova fronteira ao Oeste, Kansas, Oklahoma e ao longo do Sul dos EUA, no Rio Mississippi. A própria música temática do musical Oklahoma desenvolve o estilo responsório, trocando de vozes a cada frase e possui o estilo Country do velho Oeste norteamericano. Em "Showboat" ambos negros e brancos participam da peça, um musical integrado racialmente, inclusive com um coro de negros e outro coro de brancos. A canção Negro espiritual, Ol' Man River, foi escrita por Jerome Kern para este musical, Showboat. Eles comiam chouriço e batatas cozidas apenas uma vez por dia. Sem comerem mais nada tiveram vontade de cantar canções revoltosas e daí nasceu o ragtime.
Texto
O texto, frequentemente, é simples e tem uma frase principal para cada verso, que se repete, às vezes até quatro vezes (as quatro frases melódicas do primeiro verso); e, no refrão, finalmente responde o que os versos repetem. Às vezes o texto inicial é uma pergunta, noutras só uma mensagem. Existe até a sugestão de que os negros, enquanto eram escravos, por não poderem conversar quando trabalhando na construção da ferrovia, por exemplo, ficavam ansiosos para se comunicar; eles, então, cantavam uns para os outros com suas perguntas, e às vezes, o outro que estava trabalhando próximo respondia, cantando o refrão. Os temas eram do gênero: "Jesus é meu amigo", ou "Vou trabalhar na ferrovia, com Jesus ao meu lado". A idéia temática vinha com a inspiração do Velho Testamento bíblico, com os filhos de Israel, a história de Moisés, e a premissa que o Deus do Velho Testamento destruiu os inimigos. Existe até um espiritual específico, Wade in the Water que a letra possui instruções de como fazer para fugir… "em direção a água" (para que os cães não possam rasteá-los, obviamente).
"Ande na água (criança)
Ande na água
Ande na água
Deus vai atormentar a água

Se voce não acredita, eu fui perdoado
Deus vai atormentar a água
Eu quero que você siga-o até as margens da Jordânia
(Eu dissse) Meu Deus vai atormentar a água
Voce sabe quão gelada água é escura e fria
(Eu sei que meu) Deus vai atormentar a água
Voce sabe que ela esfria meu corpo mas não minha alma
(Eu disse que meu) Deus vai atormentar a água

(Vamos) vamos andar na água
Andar na água (criança)
Andar na água
Deus vai atormentar a água

Bom, se voce chegar lá antes de mim
(Eu sei) Deus vai atormentar a água
Diga aos meus amigos que eu também estou indo
(Eu sei) Deus vai atormentar a água
Algumas vezes eu estou bem, Senhor! Algumas outras eu estou mal.
(Voce sabe que meu) Deus vai atormentar a água
Algumas vezes eu estou caído
Deus vai atormentar a água
(Eu sei que meu) Deus vai atormentar a água

Ande na água (criança)
Ande na água (criança)
Deus vai atormentar a água[2]
Exemplos
Entre alguns famosos Espirituais podemos citar:
·         "Go Down, Moses"!
·         "Were You There"
·         "Swing Low, Sweet Chariot"
·         "Amazing Grace"
·         "Ol' Man River" do musical da Broadway, Showboat (1927) de Kern e Hammerstein.
Este último espiritual fez tanto sucesso que muitos cantores modernos ainda cantam. Em 1972, o cantor, jim Croce lançou-a numa versão Country, em seu primeiro álbum, e teve um bom retorno do público nosEUA.


Texto 02:
NEGRO SPIRITUALS: CANÇÕES DE RESISTÊNCIA
Aqui temos um texto sobre o Negro Spiritual que deve ser observado enquanto agente histórico na esfera emancipatória do movimento negro. Escrito por Walter Passos (Teólogo, Historiador, Pan-africanista, Afrocentrado e Presidente CNNC – Conselho Nacional de Negras e Negros Cristãos. Pseudônimo: Kefing Foluke. E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br)
Um dos mais belos ritmos musicais de resistência na escravidão foram os chamados spirituals, e diversos estudos sobre a sua origem ainda são temas de pesquisas de musicólogos, teólogos e historiadores.
De acordo com o excelente artigo escrito pelo musicólogo Juarês de Mira: “A musica sempre esteve presente nas aspirações e lutas por liberdade dos negros desde que nas Américas, aportaram trazidos como escravos. Deles foi roubado, sua língua, família, e grande parte de sua cultura; ainda assim seus opressores não puderam remover a sua música, que era a expressão da alma deste povo. Ano após ano esses escravos e seus descendentes aceitaram o cristianismo que era a religião de seus senhores. A Música era parte integrante do dia a dia do africano e era usada nos trabalhos, nas caçadas, nas festas, enfim toda a atividade era pontuada com musica. O poder desta musica da Diáspora aparece como elemento condutor da grande herança ancestral e cultural da Mãe África.
O Musicólogo M. Kolinsky fez um estudo comparativo de Negro spirituals e Canções Nativas da África Ocidental, e muitos eram idênticos, ou intimamente aparentados em estrutura tonal (escala e modo). Um Spiritual que ficou mundialmente conhecido no arranjo de Bob Dylan (many Thousands Go) , No More Auction Block For Me, segundo Kolinsky é claramente idêntico a uma canção do povo Achanti (Gana).”. Leia todo o artigo: http://negrospirituals.blogspot.com/2008/05/negro-spirituals-um-canto-de-liberdade.html
Analisar as manifestações libertárias pretas com os olhares das ciências sociais brancas, utilizando os seus instrumentos metodológicos deformados e preconceituosos, infelizmente, tem levado estudiosos pretos a tecerem conclusões equivocadas, como se estes fossem modelos a serem seguidos por nosso povo. Já se passou o momento de aceitar as conclusões dos pesquisadores brancos sobre a nossa história, as nossas manifestações religiosas, as nossas vivências. Os que escreveram e escrevem sobre nós, as suas análises, independente se forem feitas em grandes centros acadêmicos, tem que ser questionados e postas à prova. Sempre duvide dos estudos feitos pelos descendentes dos escravizadores, e no caso especifico dos catequizados pelo catolicismo e convertidos ao protestantismo desconfiem quando falarem da história dos hebreus e da cor de Yahoshua.
A escravidão foi formada de grandes campos de concentração baseada no latifúndio, na monocultura e exploração da mão-de-obra escravizada. O alento, a esperança, a contestação e o desafio as normas escravistas vigentes, foram também expressas através da musicalidade em toda a América escravista.
Os Negros Spirituals tornaram-se uma das formas mais elaboradas de cânticos e práticas de resistência especialmente nos Estados Unidos da América, que serviram como mensagens e manutenção da unidade para o enfretamento contra o sistema cristão branco escravista e manutenção de resquícios históricos ancestrais.
Diversas canções foram códigos de fugas ocultos e de duplas mensagens, planejando rebeliões ou evitando recapturas de escravizados fugidos. Os negros spirituals estão fortemente ligados a revolta do pastor preto Nat Turner, terma já publicado neste blogger: http://cnncba.blogspot.com/2007/11/nat-turner-o-profeta-guerreiro-lder-da.html. Relacionamos também os spirituals a Harriet Tubman valorosa mulher preta que lutou contra a escravidão, o racismo e o direito ao sufrágio das mulheres, entre seus fatos importantes houve incursões para libertar mais de setenta escravizados, conhecidas como Black Moses.
Entre tantas canções citamos os exemplos de: "And He never said a mumbelin’ word," "Go down Moses," "Oh Freedom," e "Steal Away to Jesus."
Uma das grandes características dos intelectuais pretos protestantes brasileiros é desconhecerem a sua história africana. Ignorar a civilização hebraica e sua migração para extensas regiões da África Ocidental e conseqüente escravização para as Américas, criando diversas formas de resistência, tornou-se uma forma de embranquecimento histórico e teológico, os tornando co-participes da má interpretação da história bíblica e do verdadeiro Povo Hebreu. Não detendo esse conhecimento ou negando a aprendê-lo, incorre em erros de análises. Como foi o caso de um antigo pastor preto o qual escreveu um artigo na Revista Simpósio nº 27 de junho de 1983, páginas 237 -252. Este artigo escrito pelo Reverendo Leontino Farias dos Santos, doutor em teologia e pastor da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPI), intitulado: Aspectos sociolingüísticos da tradução de hinos protestantes Camp meetings e Negro Spirituals. Apesar de o reverendo tentar explicar a origem da musicalidade dos escravizados repete concepções calvinistas de superioridade racial branca: “...Os fieis geralmente assim procediam porque estavam excitados a ponto de chegar ao frenesi, ao êxtase em seu mais alto grau, onde toda a ordem é esquecida e cada um dança, rodopia, pula berra e canta como quer, apesar de na vida normal ser pessoa pacta e disciplinada. As pessoas envolvidas perdem a noção do ridículo e se lançam a histeria, possuídas por espíritos estranhos, com berros, uivos, linguagem ilógica e cânticos espirituais... Queremos nos referir à criatividade, capacidade de improvisação e harmonia que caracterizam os cânticos espirituais dos negros. Sem técnica pré-estabelecida, sem ensaios, sem cultura musical e sem cultura geral historicamente reconhecida pelos povos mais desenvolvidos... Outra característica é a criação de canções de sofrimento com demonstração de espírito de resignação...” O autor usa adjetivos discriminatórios ao referir-se a expressões corporais africanas, repetindo termos da academia branca que se considera humana e trata os africanos e seus descendentes como “bestiais”: “As pessoas envolvidas perdem a noção do ridículo e se lançam a histeria, possuídas por espíritos estranhos, com berros, uivos, linguagem ilógica e cânticos espirituais..”.
Como é o caso do Reverendo Leontino, um homem preto, que deveria reanalisar o texto, e reescrevê-lo com uma concepção empretecida, livre das influências acadêmicas brancas calvinistas, apesar de trazer para época informações interessantes, no meu caso particular, de ter acesso há 26 anos. O que me levou a refletir sobre esse tema não sendo um musicólogo foi a canção Kum Ba Yah, uma das musicas favoritas da COPATZION (Comunidade Pan-Africanista de Tzion).
O que chama a atenção imediata é o nome sagrado de Yah nesta linda canção. Yah é abreviatura de YHWH, não devemos pronunciar Jah, Javé ou Jeová porque não existe na língua hebraica a letra J. Uma das primeiras perguntas: Como os escravizados conheciam essa canção com o nome sagrado de Yah?
Encontramos o nome de Yah que é uma abreviação de YHWH cerca de 50 vezes nos livros bíblicos e citamos alguns exemplos:
A primeira ocorrência do nome Yah ocorre em Êxodo 15:2, quando Moisés e o Povo Hebreu cantam uma canção sobre a derrota de Faraó e seus cavaleiros:
(Yah é a minha força e canção e Ele se tornou a minha salvação)
Esta canção veio do continente africano e não foi influenciada pelos escravizadores cristãos brancos, sendo especial entre os spirituals na escravidão. O conhecimento do nome sagrado de Yah pelos escravizados pretos antes da catequização nos dá pistas sobre a presença de hebreus pretos na África Ocidental e faz-nos refletir a história do povo hebreu e sua diáspora, sendo este um tema a ser publicado futuramente neste Blogger.
Louvado seja Yah para sempre! Hal-le-lu-Yah!!!

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